sexta-feira, 11 de março de 2011

Governo: dá para construir hidrelétricas e erradicar a miséria?

O jornal Valor Econômico traz, nesta quarta, uma matéria que discute a agenda prioritária da presidenta Dilma Rousseff, com foco em projetos de longo prazo, na Copa do Mundo e na Olimpíada e no Plano Nacional de Erradicação da Miséria, que deve ser lançado ainda no primeiro semestre.

Ao mesmo tempo que vários ministérios estão sendo cobrados para sugerirem ações para esse Plano, o Planalto está exigindo pressa na execução das obras das hidrelétricas de Jirau, Santo Antônio e Belo Monte. Lembrando que não são as únicas: há um rosário de usinas de porte que estão planejadas para a Amazônia Legal, mais de dez, em rios como o Tapajós, o Tocantins e o Apiacás.

Coincidentemente, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) lançou nesta quarta sua Campanha da Fraternidade 2011 com o tema “Fraternidade e a Vida no Planeta” (bem melhor do que aquele sobre a vida, que atacava o sagrado direito ao aborto e à eutanásia). O objetivo é ajudar na conscientização sobre a ação danosa do homem, que girou o termostato do planeta para o modo “gratinar”.

Poderia citar Bento 16, que comentou o lançamento, mas prefiro resgatar Pedro Casaldáliga – que daria um papa muito melhor, a bem da verdade. Símbolo da luta pelos direitos humanos no Brasil, nos contou uma vez que ouviu uma justificativa da boca de um fazendeiro português com terras no Mato Grosso que serve feito uma luva para o que estou querendo dizer: “Dom Pedro, o senhor é europeu, o senhor sabe. As calçadas de Roma foram feitas por escravos. O progresso tem seu preço”.

Há um comportamento contraditório e, por que não dizer, (só aparentemente) esquizofrênico, que coloca em risco a própria meta de erradicação da miséria. Pois, se por um lado, os grandes projetos do governo federal são indutores de desenvolvimento econômico, por outro são responsáveis por levar milhares de pessoas a conhecerem a miséria de perto.

Tendo em vista os graves impactos causados em trabalhadores rurais e em populações tradicionais, como povos indígenas, em processos em andamento como os das hidrelétricas de Estreito e as já citadas Jirau, Santo Antônio e Belo Monte, temos idéia do festival de desrespeito aos direitos humanos que vai baixar nos próximos anos por lá. Como sempre os grandes projetos de desenvolvimento da Amazônia vêm acompanhados de promessas de rios de leite e mel para a população local, mas na maioria das vezes os impactos negativos são tão grandes senão maiores que os positivos. Bom mesmo é para a gente do Sul e Sudeste ou das grandes cidades que vai consumir grande parte dessa energia, exportada para os nossos ar condicionados, videogames e para a produção de nossas latinhas de alumínio.

O atual governo, que começou com um discurso lembrando os que tombaram pelo caminho na luta pela redemocratização no dia 1º de janeiro, está esquecendo que os que ficaram não morreram apenas por direitos civis e políticos – mas também pelos sociais, econômicos e culturais. Não era apenas para poder se expressar e votar, mas para que aqueles que eram vítimas de arbitrariedades e tinham suas casas derrubadas em nome do progresso do “país que vai pra frente” pudessem ter uma alternativa além do “ame-o ou deixe-o”. Mudaram os governantes (em parte, é claro, haja vista a presidência do Senado…), mas mantivemos modelos de desenvolvimento que dariam orgulho aos maiores planejadores daquele período: de que, para crescer rapidamente e atingir nosso ideal de nação, vale qualquer coisa, passando por cima de qualquer um.

O Estado não funciona como um bloco único mas como algo dividido. Contradições fazem parte da estrutura do Estado e moldam a sua organização e seu funcionamento. Há dois lados na Esplanada dos Ministérios, um que têm poder e dinheiro e outro, com boa vontade. A área social é abastecida com migalhas em recursos financeiros e em prestígio se comparado à outra. Ambos os lados desejam levar o país a um outro patamar, o problema é como.

Através da superexploração do trabalhador e do esgotamento do meio ambiente ou de uma forma mais racional, provavelmente com lucros menores, mas feito de forma consultada e democrática.

Repito o que já falei e, consequentemente, me levou a ser chamado de vários nomes feios: não adianta elevar a questão dos direitos humanos nas relações internacionais e fazer caca aqui dentro. O crescimento tem que estar sujeito ao respeito dos direitos fundamentais e não flanar sobre eles.

Transcrito de http://blogdosakamoto.uol.com.br/ em 11.03.2011, as 19h55min.

3 comentários:

Breno Câmara disse...

Eu diria ao Sakamoto, que este foi o parágrafo mais rico do seu texto. Temos nele um breve resumo da situação presente no Brasil.

"O atual governo, que começou com um discurso lembrando os que tombaram pelo caminho na luta pela redemocratização no dia 1º de janeiro, está ESQUECENDO que os que ficaram não MORRERAM APENAS por DIREITOS civis e políticos – mas também pelos sociais, econômicos e culturais. Não era apenas para poder se expressar e votar, mas para que aqueles que eram VÍTIMAS de ARBITRARIEDADES e tinham suas casas derrubadas em nome do PROGRESSO do “país que vai pra frente” PUDESSEM ter uma alternativa além do “ame-o ou deixe-o”. MUDARAM os governantes (em parte, é claro, haja vista a presidência do Senado…), mas MANTIVEMOS modelos de desenvolvimento que dariam orgulho aos maiores planejadores daquele período: de que, para crescer rapidamente e atingir nosso ideal de nação, vale qualquer coisa, passando POR CIMA de QUALQUER UM."

Em destaque: algumas palavrinhas muito íntimas da história do Brasil. E claro, sem comentarios para nosso PRESIDENTE DO SENADO!

Anônimo disse...

É gente, o desenvolvimento tem uqe ser sustentável não só para o meio ambiente, mas para o "meio humano".
Ótimo texto.
by:Robson Ribeiro

Beatriz Lima disse...

Professores!
Deêm uma divulgada nesse blog nas suas turmas: http://buracosdenatal.wordpress.com/
Não sei se vocês conhecem, mas criaram esse blog pra catalogar todos os buracos da nossa cidade. As pessoas mandam fotos e enviam o endereço do buraco e eles catalogam nos mapas. Super interessante, e tem dado resultados!