Vocês todos sabem que, além de História, também estudo Direito. A minha dica literária para o recesso junta esses dois saberes. É o novo livro do historiador paulista Boris Fausto, intitulado O crime do restaurante chinês: carnaval, futebol e justiça na São Paulo dos anos 30.
A maioria de vocês deve se questionando: por qual motivo deveria ler um estudo que fala sobre a justiça paulista na década de 30?
Para responder a essa pergunta, farei um pequeno esclarecimento historiográfico. Nos anos 60, um historiador italiano chamado Carlo Ginzburg inaugurou uma nova forma de se ver a história: a micro-história. Seu intento era o de, partindo de uma situação singular – uma biografia de alguém “desconhecido” ou um processo inquisitorial, por exemplo – conseguir visualizar situações históricas consideradas, até então, pouco importantes, visto que as principais escolas historiográficas – o marxismo e a segunda geração dos Annales – se preocupavam mais com as generalidades, as estruturas e a longa duração. Ginzburg queria entender as situações cotidianas, a mentalidade, o imaginário das pessoas, a influência de um livro sobre a visão de mundo de um pobre moleiro parcamente alfabetizado do interior da península itálica, como o fez em O queijo e os vermes.
Boris Fausto segue essa idéia. A partir de um horrendo crime – acontecido em 1938, quando foram assassinadas quatro pessoas, sendo três esmagadas por um cilindro de madeira usado como pilão no restaurante – o autor trata das repercussões do caso na sociedade paulistana, tendo os jornais da época como principais fontes.
No decorrer da narrativa, Fausto, ao se prender nos autos e nas perícias feitas pela polícia e por cientistas, analisa uma série de situações que ocorriam no Brasil à época, como a crença no pensamento criminológico de Cesare Lombroso – em consonância com a perspectiva do Darwinismo Social –, que terminava por justificar cientificamente o racismo.
O principal suspeito do crime, Arias de Oliveira, negro, já estava condenado antes mesmo do julgamento, dado à cobertura dos tablóides paulistas, que transformaram o caso numa verdadeira jogada para aumentar seus rendimentos (isso me lembra o recente o caso Eloá...). Mas aí surge um advogado da Frente Negra – uma associação de negros da classe média paulistana – que passa a defendê-lo com enorme sucesso.
Ao longo da narrativa do caso, aspectos como futebol, carnaval, racismo, imigração e Estado Novo são muito bem trabalhados pelo historiador, fato que nos faz compreender o Brasil da época.
Não vou contar a história inteira, porque perde a graça. Mas é uma excelente dica! Ricamente ilustrado, escrito em ritmo de romance policial, com um enredo que surpreende até o mais criativo roteirista de Hollywood, o livro nos cativa ao ponto de não querermos dormir, só para continuar lendo. Eu mesmo o li em uma tarde/noite!
Boa leitura!
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Livro: O Crime do Restaurante Chinês.
Autor: Boris Fausto.
Editora: Companhia das Letras.
Ano: 2009.
Páginas: 236.
Média de preço: R$45.
2 comentários:
Caríssimo João Carlos,
Acabei de ler "O Crime do Restaurante Chinês", num fôlego só; comecei noite passada e terminei já dia claro.
Belísssimo livro! permita-me uma bronca pública: por que voce não me essa leitura indicou antes?!
Fraterno abraço,
Adailton
Indiquei agora porque o livro foi publicado em maio de 2009. Acabou de sair do prelo hehehe!
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