Não acredito que a decisão do STF seja um retrocesso quando extingue uma lei criada pela ditadura militar, uma das tantas ferramentas (censura, etc) utilizadas pelos militares para impedir a liberdade de expressão no Brasil. Acho que a decisão do Supremo não extingue as faculdades de comunicação nem desvaloriza os jornalistas diplomados, apenas elimina a exigência imposta pela ditadura na vigência do tempo negro da república brasileira.
Agora, achar que o mau exercício da profissão é causado por pessoas sem habilitação superior em jornalismo, sem formação acadêmica ou coisa do gênero , é tão distorcido como a lei da ditadura que impôs a exigência do diploma. Até porque nesses quarenta anos de vigência da lei da ditadura (contrariando a constituição federal), o exercício da profissão e suas irregularidades foram cometidas por jornalistas formados e com diplomas.
Ética, responsabilidade, seriedade, compromisso com a verdade e isenção não são forjados nos bancos das faculdades. Podem e devem ser incorporados ao aprendizado. Mas, certas coisas estão enraizadas no caráter da pessoa, vem da formação familiar, da construção da consciência e da visão histórica dos fatos que fazem o mundo em que vivemos, os quais transformamos em notícias para quem não participa desses momentos.
Acho que podemos evoluir sem o medo de ficar a margem do processo produtivo por que o STF extinguiu uma lei da ditadura militar e restaurou a constitucionalidade do livre exercício da expressão e opinião. Não é o sindicato quem deve policiar (como os censores na ditadura) as contratações de jornalistas com ou sem diploma. A sociedade sabe distinguir o que é bom do que é mau. As empresas também sabem que quanto mais competência tiver um profissional integrante de seus quadros de pessoal, mais credibilidade ela terá perante a opinião pública. O contrário também é verdadeiro.
O filtro entre o bom e o ruim não é propriedade da ditadura do diploma ou o corporativismo ultrapassado dos organismos sindicais , mas uma prerrogativa da própria sociedade, do conjunto de cidadãos e cidadãs que compõem o objetivo das empresas de comunicação do país; jornais, revistas, rádios e TVs. São o objetivo é serão, sempre, os censores naturais do que presta e daquilo que não vale a pena ser levado em consideração.
Depois, o mau exercício profissional não é privilégio de quem não tem um diploma de jornalista. Em todas as atividades sociais e produtivas existem aqueles que cometem os excessos e aqueles que agem com seriedade encaram suas profissões com honestidade e isenção profissional. Do catador de lixo ao grande empresário, da dona de casa ao prostíbulo, do advogado ao jornalista, da polícia aos políticos, em todas as categorias existem aqueles que cometem irregularidades e denigrem a profissão. Na verdade, representam uma parcela inexpressiva do conjunto de trabalhadores brasileiros, mas existem e atuam impunemente, muitos deles com apoio e trabalho de jornalistas diplomados.
Para os excessos que distorcem o exercício profissional do jornalista (com ou sem diploma), o Código Penal Brasileiro é o melhor caminho para a correção. Não precisamos de Conselhos profissionais como desejou o partido do Lula para “ocultar a censura branca do PT” e impedir que as possíveis “irregularidades” do governo Lula fossem alvo da liberdade de imprensa, do livre exercício da expressão e da manifestação de opinião sem tutela e sem medo.
Lembre-se que os mais importantes nomes do jornalismo brasileiro pré 64 exerciam a profissão sem a necessidade do diploma. Eram jornalistas provisionados e depois de um ano no batente, ganhavam o registro de jornalistas profissionais. Foram ícones da resistência à ditadura. Para calar a resistência e a livre manifestação do pensamento, os militares criaram a censura (triste para a história do país) e, posteriormente, no governo militar (Costa e Silva/Médici/Ernesteo Geisel/Figueiredo), editou a Lei impondo a exigência do diploma, como forma de afastar das redações pessoas capazes de exercer a profissão porque não era conveniente ao regime militar certas opiniões e reportagens. A Lei do Diploma, também foi uma forma de controlar o ensino da profissão nas faculdades, formando profissionais menos comprometidos com a resistência ao golpe militar de 64 e a verdadeira história do período da ditadura militar brasileira (a ditabranda, como escreveu na Folha, um jornalista diplomado).
O grande problema do Brasil, e aí não é exclusivo da categoria dos jornalistas, mas de todo universo sindical, é que o sindicalismo atual brasileiro ainda vive como se o país estivesse nos anos 70/80, e não num outro século, 40 anos à frente, onde a globalização fez do mundo uma aldeia global sem fronteiras, onde a liberdade de expressão não pode se prender a uma lei esdrúxula criada pela ditadura militar brasileira para impedir que mentes brilhantes do país exercessem o livre e sagrado direito de manifestar sua opinião numa publicação, numa emissora de rádio ou TV.
Apoiar uma Lei da ditadura militar brasileira é retrocesso. Isso sim...
Marcus Ottoni, jornalista.
9 comentários:
Gostei. Tirou as palavras da minha boca.
Por que essas pessoas, se querem tanto escrever ou aparecer em jornais, não se formam?
Já que eles querem se dedicar a profissão ou, pelo menos, é o que me parece.
Não gosto muito da revista, mas o editoral da "Veja" dessa semana também tem argumentos interessantes sobre essa situação dos jornalistas. Ela lembra que o Brasil se aproxima de países com maior liberdade de expressão, como Alemanha, França e EUA, nos quais não é necessário ser diplomado para escrever em jornais.
Outra coisa: o STF não criou uma lei. O judiciário não cria leis e o que o STF fez foi realizar o controle de constitucionalidade, ou seja, verificar se uma lei (editada em 1969) era ou não constitucional. Se ela feria ou não feria os princípios formais e materiais da constituição de 1988.
Deve-se lembrar que a referida lei, editada nos anos de chumbo da ditadura militar, foi uma maneira pela qual o governo dos generais conseguiram exercer domínio sobre redações de jornais e revistas, sobretudo porque a maior parte dos grandes jornalistas brasileiros da época não eram formados em Comunicação Social. Assim, exigir o diploma era impedir o exercício da profissão desses grandes nomes.
Por fim, não é o fim do mundo. Muitas outras profissões não são regulamentadas, dentre as quais a minha, a de Adailton e de todos os professores de história desse país: a de Historiador. Isso não significa que deixamos de ter local de trabalho ou que o saber que nós aprendemos nos bancos acadêmicos virou pó.
Outras visões sobre o tema:
Visão a favor
http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=542DAC007
Visão contrária
http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=542DAC008
Agora, João Carlos, não sei se você concorda comigo, mas a educação, por exemplo. Como você bem disse:"Muitas outras profissões não são regulamentadas, dentre as quais a minha, a de Adailton e de todos os professores de história desse país: a de Historiador". Logicamente que existem bons professores de hístória sem os estudos formais. Contudo, a maioria dos professores sem estudos formais não são bons. E aqueles que são assistidos por eles não sofrem muitas dificuldades? E como seria se outras profissões se apossasem dessa condição?
Creio que o ponto principal do diploma é que, para chegar a ele é necessário uma preparação. Claro que pessoas que não são formadas podem ser tão quanto, ou mais preparadas que os que são formados, porém são casos a parte. Então acho que o diploma para o jornalismo deveria continuar a ser exigido como em qualquer outra profissão!
Gostaria muito de ver se esse tal jornalista perdesse parte de sua renda,tendo como alegação da empresa ao qual ele trabalha a afirmação que há mais gente no mercado cobrando um salário mais baixo.
Retrocesso é apoiar uma medida desse tipo pois,além de desvalorizar o trabalho de jornalista contribui para o aparecimento de pessoas sem o menor nível cultural para exercer tal profissão!
Concordo Victor!
O bom vai ser quando tiver muita gente qurendo ser jornalista a qualquer custo! E o mais cuioso de tudo, por qualquer salário!
E outra... Ninguem pensou na condição dos milhares de estudantes de comunicação no Brasil! Algo tem que ser feito para que eles não saiam prejudicados.
O mercado trata de excluir os jornalistas ruins. Não devemos esquecer que nem todos os jornalistas diplomados são devidamentes compromissados com a responsabilidade que sua profissão lhe confere. Quem for bom, o diploma só irá confirmar sua competência. Compartilho da mesma opinião de João Carlos, e quem é jornalista diplomado não deve temer, afinal, cada um faz seu sucesso.
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